Moacyr Lopes Junior/Folhapress
"Em nome de Jesus, saia pelas mãos, pelos pés, pela boca!" A frase é
exaltada inúmeras vezes nas missas celebradas pelo monsenhor Joaquim
José Stein, 70, e dirigida contra o mal que supostamente aflige centenas
de fiéis que participam das sessões de "cura e libertação".
A rotina se repete três vezes por semana a poucos metros da avenida
Paulista, na igreja Nossa Senhora do Paraíso -que segue um dos ramos do
catolicismo, mas independente da Arquidiocese de SP.
Após a pregação tradicional, Stein anuncia: "Vamos para a sobremesa. Sei
que muitos de vocês vêm aqui para a cura e a libertação".
Em seguida, orienta seus assistentes, vestidos de branco, a se
posicionarem diante do altar e rezarem para a "cura do mal, para a
proteção contra a maledicência, cura de doenças e enfermidades,
ressentimentos, traumas".
Os fiéis se aproximam do altar. Trazem fotos de parentes, carteira de
trabalho e até imagens em celulares para a bênção do padre. Ele se
aproxima dos fiéis e toca suas testas. Alguns caem para trás e,
escorados pelos assistentes, acabam deitados, deixando seus pertences no
piso do altar.
Há quem entre em sono profundo no desconfortável piso. Outros caem, mas permanecem conscientes e logo em seguida se levantam.
As cenas, diz o padre, são consequência de um momento de relaxamento, com "possibilidade de sono profundo".
A cerimônia é tratada como "experiência de um dom do repouso no Espírito
Santo". O sacerdote diz que é um momento de relaxamento físico para a
cura espiritual.
A coordenadora dos assistentes, Eliana Pinna, 53, orienta a fila,
conversa com os fiéis, dá conselhos e comenta que, na sessão anterior,
"o bicho pegou, o monsenhor teve trabalho".
Para algumas pessoas, Stein faz uma reza mais intensa. Apoia a cruz no
corpo do fiel, e, em casos extremos, põe o pé sobre o peito de quem está
estendido no chão. "O mal não quer ser pisado, então eu o humilho com o
poder do Espírito Santo", declara.
A estratégia tem ainda outro motivo. O sacerdote diz que, devido à
idade, não pode se abaixar com frequência para alcançar o fiel deitado.
Em poucos casos, o fiel resmunga, esbraveja. Stein então se abaixa e, com a cruz em punho, manda o mal sair.
O "possuído" faz movimentos de regurgitação e se recupera lentamente
após minutos de forte agitação e clima tenso entre os fiéis.
Stein nega que se trate de exorcismo. Em seguida, admite as semelhanças. "Exorcismo é o termo oficial. Faço cura e libertação de problemas psíquicos, espirituais, o que no fim é a mesma coisa."
"Não estou aqui para explicar que o demônio existe. Quem diz isso é a Bíblia", afirma o monsenhor.
Frequentadora da igreja há seis anos, a massoterapeuta Ilma Silva, 50,
diz que Stein resolveu o que outros não conseguiram: uma forte dor nas
articulações. "Era uma doença espiritual. A gente fica mais leve depois
da missa."
Stein afirma que o ritual de cura e libertação está ligado à Renovação
Carismática -corrente católica da qual é adepto e que adota linguagem
mais parecida com a de parte das igrejas evangélicas.
No final da cerimônia, uma jovem de 35 anos cai no chão e chora
dramaticamente. O padre se ajoelha, coloca a cruz sobre o peito da
mulher por alguns minutos e a deixa soluçando. A chefe dos voluntários
diagnostica: "O caso dela é de opressão".
GRECO-MELQUITA
O monsenhor Joaquim José Stein conta que foi ordenado padre durante
missa celebrada pelo papa João Paulo 2º no Maracanã, no Rio, em 1980.
Na época, estava havia poucos meses na Igreja Greco-Melquita –um dos
ramos do catolicismo–, a convite de um bispo que conheceu ainda
seminarista, em Minas. Essa igreja tinha como seguidores principalmente
imigrantes libaneses, sírios, egípcios e jordanianos.
O ritual de cura conduzido por Stein está longe de ser um consenso
dentro da Igreja Católica –foi proibido em várias dioceses do Brasil e
do mundo.
O próprio monsenhor conta que foi obrigado a abandonar o ritual por
alguns anos. Atualmente, diz ele, tem autorização para fazer a cura.
Stein é subordinado ao bispo (eparca, na denominação usada na Igreja
Greco-Melquita) Joseph Gébara, que está em viagem fora do Brasil.
Em nota, a Arquidiocese de São Paulo informou que "a Eparquia
Greco-Melquita é independente da Arquidiocese de São Paulo. É uma igreja
de rito oriental, que está em comunhão com o papa".
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